Vinho, canabis, cabeleireiro, missa... Em tempo de confinamento a “primeira necessidade” varia de um país para outro.

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mar | 2020

Vinho, canabis, cabeleireiro, missa... Em tempo de confinamento a “primeira necessidade” varia de um país para outro.

Diante a propagação do coronavirus pelo mundo, vários governos impuseram restrições drásticas... Com algumas exceções culturais.

 

Quais são os critérios para determinar o que é primeira necessidade? Enquanto o mundo é atingido pela pandemia de Covid-19, vários países, nesses últimos dias, tomaram medidas drásticas para erradicar a propagação do vírus responsável por essa doença.

 

Sábado 14 de março, na esteira de medidas tomadas por alguns de nossos vizinhos europeus o primeiro ministro francês, Edouard Philippe, anunciava assim solenemente: “o fechamento, a contar da meia-noite, de todos os lugares que recebam público, não indispensáveis à vida do país. Trata-se notadamente de restaurantes, cafés, cinemas, discotecas... Trata-se igualmente de todos os comércios à exceção dos comércios essenciais”.

 

Mas o que quer dizer, ao certo, “essenciais”? É preciso constatar que se vários Estados adotam estratégias globalmente similares de luta contra a epidemia, essa noção sofre algumas exceções culturais.

 

  • Na França, comerciante de vinho.

 

Interrogado na manhã da quinta-feira 19 de março na (rádio) France Inter, o ministro da economia e das finanças, Bruno Le Maire defendeu que as livrarias, duramente atingidas pela concorrência dos gigantes das vendas on line, releva do comércio de primeira necessidade “É minha convicção’, martelou o ocupante de Bercy (ministério da economia), dizendo estar “pronto para reabrir o debate” sobre o estatuto das livrarias.

Se o destino desse setor ainda está em suspense, uma outra questão foi debatida desde o começo da semana: a situação dos comerciantes de vinho. Caso de fazer escola na pátria do vinho. Assim, o decreto publicado em meio aos anúncios do primeiro ministro fazia, de maneira assaz vaga, menção aos “comércios alimentares, farmácias, bancos, postos de gasolina ou distribuição de imprensa”, dando lugar a diversas interpretações. Um segundo decreto detalhando as estruturas envolvidas, confirma a autorização de abertura para os “comércios varejistas de bebidas em lojas especializadas”, como os comerciantes de vinho.

 

Alguns escolheram, todavia, de baixar as portas, como é o caso das grandes redes, como Nicolas, La Vignery ou o Le Repaire de Bacchus, que anunciaram a cessação de suas atividades por tempo indeterminado.

 

Na Bélgica, os salões de beleza.

 

No país plano os lugares acolhedores de público e os comércios não essenciais fecharam a partir do final de semana do 14  e 15 de março... Mas os belgas podem continuar se embelezando. O governo, de fato, abrandou suas diretivas e autorizou os salões de cabeleireiros a permanecerem abertos durante a semana, unicamente com hora marcada e acolhendo um só cliente de cada vez.

 

Uma decisão que não tem, entretanto, a unanimidade, em particular junto aos representantes do setor Cabeleireiro.org, que fala de uma “decisão muito contraditória” da parte das autoridades federais: impossível garantir a distância sanitária de um metro entre as pessoas.

 

  • Na Áustria, os parques e áreas de lazer.

 

No país, onde um confinamento severo foi decidido bem cedo, teve uma batalha política sobre os parques, com destaque para a capital, Viena, onde os parques são um verdadeiro orgulho local. Os ecologistas, que aqui governam com os conservadores, obtiveram que “ir passear” faça parte das exceções de saídas autorizadas.

Após alguns dias de confusão durante os quais os prefeitos tinham decidido de fechar os espaços verdes, o vice-chanceler ecologista Werner Kogler anunciou orgulhosamente no Twitter, 19 de março : “os parques e as áreas de lazer abrem de novo suas portas!”

 

« As pessoas precisam de alguma coisa para respirar », justificou o ministro da saúde, Rudolf Anscholler, igualmente ecologista, precisando que só as saídas solitárias ou em família estavam autorizadas, mantendo um metro de distância de outros passeantes.

 

  • Na Holanda, os coffee-shops.

Na Holanda é um outro tipo de comércio que reabriu parcialmente suas portas, terça-feira 17 de março: os famosos “coffee-shops”. O governo holandês tinha decidido o fechamento dessas lojas onde se pode comprar e consumir canabis, domingo 15 de março, assim como o conjunto das escolas, bares, restaurantes e prostíbulos do país até 6 de abril.

 

Mas afim de evitar um eventual ressurgimento do tráfico de drogas. Haia finalmente retro-pedalou e escolheu autorizar os pedidos, mas unicamente para viagem. O consumo no local fica proibido.

 

Em São Francisco, os dispensários de canabis.

Do outro lado do Atlântico, na Califórnia, no oeste dos Estados Unidos, a municipalidade de São Francisco também foi obrigada a dar marcha à ré em certas medidas, segunda-feira 16 de março, no âmbito do confinamento. Desde o dia seguinte, a prefeita, London Breed, informava que os dispensários de marijuana ficariam finalmente com suas portas abertas para seus clientes.

 

« A canabis é um remédio essencial para muitos habitantes”, informou o departamento de saúde pública de São Francisco em um tuíte. “Os dispensários podem continuar a funcionar como as empresas essenciais durante esse período, porém praticando a distância social e outras recomendações de saúde pública.”

 

  • Na Polônia, a missa.

Se vários países, como a França, decidiram reduzir os ofícios religiosos no âmbito da luta contra a epidemia, com o apoio dos representantes dos diferentes cultos, a Polônia faz até agora figura de exceção.

 

A Igreja desse país bastante católico recusou a se dobrar às orientações do governo quando do anúncio, 10 de março, do fechamento dos estabelecimentos acolhendo público e a decisão de limitar as reuniões públicas. Diferentemente da Conferência episcopal italiana que tinha “aceitado” a decisão de Roma de suspender a organização das ”cerimônias civis e religiosas”, seu homólogo polonês tinha, em um primeiro tempo, pedido um aumento do número de serviços para diminuir o número de fiéis reunidos entre eles e assim se conformar às recomendações sanitárias.

 

Seu presidente, o arcebispo Stanislaw Gadecki, tinha então destacado: “da mesma forma que os hospitais cuidam das doenças dos corpos, as igrejas servem, entre outros, a curar as doenças da alma. E por isso é inimaginável que nós não possamos rezar em nossas igrejas.”

Mas sob a pressão do governo e da opinião pública, os bispos acabaram abrandando suas posições e “recomendando” as autoridades diocesanas a atribuição de “dispensas” de missas dominicais à pessoas idosas ou doentes, que evitarão assim de estar em situação de pecado. Esses fiéis estão convidados a participar das missas via as mídias audiovisuais e na internet.

 

Tradução: Charles Le Talludec

 

Fonte: https://www.lemonde.fr/ 

Charles Le Talludec

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Charles Le Talludec - Advogado